O senador Nelson Trad Filho (PSD) foi intimado por email para prestar depoimento como testemunha do Consórcio Guaicurus em julgamento que pode anular o contrato de concessão do transporte coletivo de Campo Grande. A audiência começa nesta terça-feira (28) no formato de videoconferência.
A intimação do senador, que era prefeito à época da entrega do contrato do ônibus para o grupo de quatro empresas, ocorreu por email na tarde da sexta-feira (24).
No ofício encaminhado para Nelsinho, o chefe do cartório informa que em razão da prerrogativa de cargo federal do político, caso o senador não possa participar da audiência desta terça, ele deve indicar outro dia e horário para ser inquirido pelo juiz, situação que não ocorreu até a manhã desta segunda-feira (27).
A audiência de instrução e julgamento será presidida pelo juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos. O julgamento é o desfecho de um processo de investigação iniciado em 2019 pelo MPMS (Ministério Público Estadual) e que chegou ao Judiciário em setembro de 2020, em forma de ação civil pública.
No processo, o Ministério Público elencou uma série de irregularidades identificadas durante a investigação e que, na visão da 30ª Promotoria de Justiça de Campo Grande, são suficientes para anulação do contrato.
A licitação que deu ao grupo de empresas o direito de faturar até R$ 3,4 bilhões explorando o transporte da cidade durante 20 anos foi finalizada em outubro de 2012 e o contrato tem validade até 2032.
Quem será ouvido em audiência que julga concessão do Consórcio
As testemunhas de acusação indicadas pelo MP são: Daniel Carlos Silveira (superintendente da Controladoria Geral da União em MS), Geraldo Antonio Silva de Oliveira (auditor federal de Finanças e Controle), Henrique Gomes da Silva Rezende (auditor federal de Finanças e Controle), Sasha Reck (advogado que delatou ao MP do Paraná direcionamento de licitação ao Consórcio Guaicurus em Campo Grande) e Marcelo Maran (delator que também prestou informações sobre irregularidades na concessão).
Todas as testemunhas de acusação, indicadas pelo MP em outubro do ano passado, foram intimadas a participar da audiência, que será no formato virtual.
A defesa do Consórcio Guaicurus, por sua vez, indicou outras quatro testemunhas de defesa, ou seja, que apresentarão informações que o grupo de empresas julga como determinantes para provar que não houve irregularidade no processo de licitação.
As testemunhas de defesa indicadas pelo Consórcio e que serão inquiridas pelo juiz são: Marcelo Luiz Bonfim do Amaral (diretor-presidente da Agereg à época da licitação), Bertholdo Figueiró Filho (presidente da comissão de licitação à época), João Rezende Filho (diretor do Consórcio Guaicurus) e, por último, o senador Nelsinho Trad, prefeito de Campo Grande entre os anos de 2005 e 2012, ou seja, em todo o período em que a licitação de concessão foi elaborada, lançada e vencida pelo Consórcio Guaicurus.
Licitação no ‘apagar das luzes’ da gestão de Nelsinho
Durante o período de investigação do MPMS, que durou quase um ano e foi encerrado em 2020 com oferecimento de ação civil pública ao Judiciário de Mato Grosso do Sul, os promotores identificaram seis grandes pontos que seriam suficientes para apontar a nulidade da concessão.
O processo licitatório se encerrou em outubro de 2012 com a declaração das empresas Viação Cidade Morena, São Francisco, Jaguar Transportes Urbanos e Viação Campo Grande — que formaram o Consórcio Guaicurus — como vencedoras. O grupo apresentou proposta de R$ 20 milhões. O encerramento da licitação se deu pouco mais de dois meses antes do fim do mandato de Nelsinho Trad como prefeito de Campo Grande.
Confira os 6 pontos de irregularidades identificados pelo MPMS:
- apresentação de garantia de proposta das empresas concorrentes antes da sessão pública de abertura dos envelopes com as propostas;
- determinação do município de que empresa vencedora pagasse R$ 5,5 milhões ao município em 180 dias;
- ausência de justificativa técnica da empresa vencedora sobre exigências de frota e serviço;
- modelo da licitação no formato melhor técnica e preço que reduziu a competitividade do certame;
- ausência de parecer técnico que justificasse a composição do valor da outorga estabelecido em 70% “técnica” e 30% “preço”;
- irregularidade do município em cobrar R$ 3 mil das empresas concorrentes para retirar cópia de documentação física referente ao edital de concorrência.
O contrato da concessão, assinado em 25 de outubro de 2012, tem como partes o então prefeito Nelsinho Trad, o diretor da Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito), Rudel Trindade, o então diretor da Agereg, Marcelo Luiz Bonfim do Amaral e Nelson Guenshi Asato, empresário representante das quatro empresas de transporte que formam o Consórcio Guaicurus.
Consórcio e município negam irregularidades
Todas as irregularidades apresentadas pelo MPMS são, ao longo dos anos, rebatidas tanto pela prefeitura de Campo Grande quanto pelo Consórcio Guaicurus. Atualmente, o processo possui 17,1 mil páginas. Entre as alegações da defesa do grupo de empresas está o fato de investigação anterior também movida pelo MP ter sido arquivada após não identificar irregularidades na concessão.
Após a definição da data de audiência para a próxima terça-feira (28), a defesa do grupo de empresas tenta, desde o início de junho, postergar a realização do julgamento se opondo ao formato de videoconferência determinado pelo juiz Ariovaldo Corrêa. Até o momento, a sessão de julgamento segue marcada para às 14 horas do dia 28.
Procurados pela reportagem do Jornal Midiamax desde a manhã desta quinta-feira (23), o senador Nelsinho Trad e a assessoria de imprensa do dele em Brasília e em Campo Grande não se manifestaram a respeito das irregularidades apontadas pelo MPMS até a publicação desta reportagem. Os contatos foram devidamente registrados e o espaço segue aberto para posicionamento.
Com informações do Jornal Midiamax