“Farra” do Proinc continua na Prefeitura de Campo Grande

O programa, cuja CPI está empacada na Câmara, emprega chefe do PCC, dono de clínica, influencer, mãe de líder da direita e professora do interior

O Proinc, programa criado pela Prefeitura de Campo Grande em 2010 e cujo único compromisso seria o de atender desempregados de baixa qualificação que comprovem integrar famílias com ganhos de até um salário mínimo, tornou-se um esculacho.  

Na relação dos beneficiários há nomes de microempresário, influencer, presidiário e até integrante do Primeiro Comando da Capital (PCC), a famigerada organização criminosa que mais impõe medo no País.

Já há um mês que os vereadores da cidade tentam criar uma CPI para investigar o programa, que também oferta curso profissionalizante, contudo, o comando da Câmara Municipal de Campo Grande blinda a prefeitura como meio de afastar um cenário de apuração do caso.  

Parlamentares interessados na questão tentam, agora, modificar as regras para a seleção dos beneficiários do plano social.

O presidente da Câmara, Carlos Augusto Borges, Carlão (PSB), aliado político do ex-prefeito da cidade e candidato ao governo de Mato Grosso do Sul Marquinhos Trad (PSD), disse que não vê prudência na criação de uma CPI agora, por enxergar interesse eleitoreiro na questão.  

As contratações dos favorecidos com o Proinc ocorreram justamente no período administrado por Marquinhos, que cumpriu parte da segunda gestão até março, quando renunciou ao mandato para assumir a condição de candidato à sucessão estadual.

LISTA SUSPEITA

Para produzir esta reportagem, o Correio do Estado obteve três relações com mais de 3,8 mil nomes  de supostos matriculados no Proinc, que paga aos inscritos R$ 1.212,00 mensais.

Pela regra de inclusão social, os integrantes do programa só poderiam ficar contratados pelo período máximo de dois anos. Antes de mencionar os casos aqui, o jornal checou se o nome do inscrito de maneira suspeita ainda constava na lista publicada no Portal da Transparência da prefeitura.

V. S. H., por exemplo, foi processada por estelionato e responde a processo em liberdade. O nome dela aparece como inscrita no programa desde setembro de 2021. 

De acordo com investigações da Polícia Civil, a favorecida “integra o PCC” há pelo menos uma década. 

Ela, conforme o Portal da Transparência do município, ainda integra o projeto e recebe um salário mínimo há quase um ano.

M. W. A., beneficiário do Proinc desde maio do ano passado, é outro caso irregular e que contraria as regras do Proinc. Ele é dono de uma clínica de fisioterapia, ativada desde 2011, há 11 anos. Mais: o capital social da empresa é de R$ 51 mil. 

Além disso, a clínica tem convênio para atender pacientes da própria Prefeitura de Campo Grande, da Santa Casa e de vários planos de saúde.  

Mesmo com este patrimônio e clientela, ele ainda recebe um salário mínimo por mês da prefeitura.  

Também na lista do Proinc consta o nome de E. L. S, que se autodenomina blogueira, ou influencer, que ganha dinheiro por meio da internet. Desde março de 2021, segundo a relação do Proinc, ela atua no programa “trabalhando na limpeza”.  

Depois de ver o nome circulando como provável beneficiária do plano de inclusão social, a inscrita surge em um vídeo que corre nas redes sociais aplicando a maior bronca. Ela chama as pessoas que a criticaram de “fdp, vai tomar no c.. me deixem em paz, estou fazendo meus ‘corre’ para quitar as contas”.

MORADORA DO INTERIOR

Uma mulher lotada na Agência de Trânsito de Campo Grande (Agetran) desde março e que estaria recebendo um salário mínimo por mês, dinheiro dos cofres municipais, também consta na lista.  

S. B. R. P. mora na cidade de Amambai, distante 350 quilômetros de Campo Grande. 

A favorecida seria formada em História pela Universidade Estadual de MS, fez concurso público e teria sido “convocada para cadastro reserva como professora daquele município [Amambai]”. O fato de a beneficiada ter formação universitária já excluiria ela do Proinc.

ENDIREITA MS

A mãe de D. A., líder do movimento político EnDireita MS, J. S., também engrossa a relação dos auxiliados pelo Proinc. Ele, que é o promoter – encarregado de promover eventos e festas em boates, danceterias – confidencia o benefício dado à mãe por meio da rede social.  

J. S. conta que durante a pandemia a mãe ficou desempregada e “conseguiu assistência no Proinc, onde atualmente trabalha e recebe pouco menos de um salário mínimo”. 

O promoter diz também que tem uma irmã adolescente e um irmão, que é médico. “Este ano minha mãe fará campanha para Bolsonaro e candidatos do EnDireita MS”, acrescentou o promoter, que garantiu não ser candidato a nada.

TRAFICANTE

Também há na lista do Proinc uma suposta favorecida, L. C., que cumpre pena por tráfico de drogas. O nome dela consta no Portal da Transparência como se ainda tivesse “vínculo” com o plano de inclusão social. L. C. foi inscrita no programa em outubro de 2020.

Vereadores já discutem mudanças no Proinc 

Vereadores se reuniram ontem na sede da Fundação Social do Trabalho de Campo Grande (Funsat) e debateram mudanças no Proinc, segundo informação do vereador Betinho (Republicanos). 

Entre as mudanças sugeridas está mais rigor nos critérios para entrar no programa, como estar no Cadastro Único para Programas Sociais. 

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