Desde que foi bombardeado por uma série de denúncias que o acusam de ter proposto sexo em troca de emprego, prática que molda o crime de assédio sexual, o ex-prefeito da Capital Marquinhos Trad, candidato ao governo de Mato Grosso do Sul pelo PSD, tem sofrido ataques políticos, incluindo de aliados.
Foi o que aconteceu ontem na Câmara Municipal de Campo Grande, dia de retorno do recesso parlamentar. Dois vereadores, ambos do PSD, por discórdia acerca do episódio, por pouco não saíram no soco. E isso no plenário da Casa.
A confusão, quase briga, começou assim que Tiago Vargas pegou o microfone e disse que “veio da Polícia Civil [antes de vereador era policial]” e que “muitos policiais estariam indignados” com a ideia de que Marquinhos Trad estaria dizendo que a polícia teria virado “instrumento político” por investigar o caso de assédio. A denúncia contra o ex-prefeito virou inquérito duas semanas atrás e segue em sigilo na Polícia Civil.
“É uma vergonha. Não cheguei até aqui com grupo político, não devo nada a ninguém, não devo nenhum favor, cheguei aqui por meio de voto popular, não conchavo político. Eu não sou acusado de assédio ou de qualquer coisa do tipo. Que patifaria, que vergonha. São denúncias de promessas de emprego em troca de cargos públicos, e ainda querem culpar as vítimas, as mulheres. Vocês estão de palhaçada com a cara do cidadão campo-grandense”, exaltou-se o parlamentar.
Em seguida, Beto Avelar, outro vereador do PSD, líder da prefeitura na Câmara, alfinetou o colega de legenda, dizendo: “Vocês têm telhado de vidro”, acrescentando que “um vídeo corre por aí”.
No tal vídeo, Tiago Vargas, então com 15 anos de idade, segundo ele, apareceria em uma cena de sexo. Vereadores ligados ao ex-prefeito estariam ameaçando vazar a imagem caso Vargas insistisse na criação de uma CPI para investigar os supostos assédios.
RESPEITO
Ainda segundo Beto Avelar, Tiago Vargas, que teria divulgado o vídeo por meio da internet, não “tem respeito pelas mulheres”.
Avelar seguiu: “Vamos falar de um vídeo que corre por aí. Isso é agressão contra as mulheres. Respeitem para que sejam respeitados”. Bastou.
A partir daí, o vereador Tiago Vargas quis avançar sobre Avelar, só não fez isso graças a outro vereador, que o segurou.
“Tenho, sim, um vídeo que fiz quando tinha 15 anos, mas não foi dentro de gabinete. Eu falo olhando na sua cara, irmão. Você está mandando recado por alguém? Aqui tem peito, tome vergonha na sua cara e cite o meu nome. Vem quente que estou fervendo”, foram as palavras ditas por Vargas destinadas a Avelar, que ficou à distância.
O presidente da Câmara, Carlão, do PSB, ameaçou encerrar a sessão, e a discussão ficou por aí.
No fim da sessão, Tiago Vargas, ao Correio do Estado, seguiu no ataque ao pré-candidato ao governo: “Se ficar comprovado que o candidato ao governo Marquinhos Trad realmente cometeu esses crimes sexuais, ele não terá condições éticas e morais para se candidatar a qualquer cargo que seja”.
Na convenção do PSD, no sábado, data que o partido oficializou as candidaturas, incluindo a de Vargas para deputado estadual, o parlamentar não foi ao evento. Ele afirmou ter mandado um ofício ao comando do partido e justificou a ausência por “não compactuar com a situação”.
PANOS QUENTES
Já Beto Avelar disse ao Correio do Estado, no fim da discussão, que “alguns vereadores estariam aproveitando a tribuna para fazer palanque eleitoral. Aí, a gente rebate e ficam bravos”.
Questionado se o PSD estaria rachado em razão das denúncias contra Marquinhos, ele afirmou: “Não. Está tudo normal, tudo tranquilo”, disse ele, minutos depois do bate-boca com o colega de partido.
Outro do PSD, Otávio Trad, primo de Marquinhos, também disse não acreditar em um racha entre os integrantes da legenda.
“Infelizmente, parece que o vereador Vargas está tendo algumas divergências com o partido, e levo comigo algo que me disseram uma vez, que é muito certo: na política, não traia, prefira ser traído. Nós aprovamos o nome dele como candidato na convenção, mesmo com as convicções dele nas questões que não baterem com as do partido. Não coibiremos esse tipo de comportamento, por enquanto ele é candidato. Vou acompanhar o desfecho”, aliviou o parlamentar.
Dos 29 vereadores de Campo Grande, oito são filiados ao PSD do ex-prefeito Marquinhos. A reportagem ouviu outros dois parlamentares da sigla, que não quiseram se pronunciar oficialmente e discordaram da ideia de racha, mas admitiram que “o período está ruim”.
Ainda segundo os vereadores pedessistas, sobre as discussões envolvendo os parlamentares do mesmo partido, “não é de hoje que têm ocorrido”. Divergências políticas até na hora de votar projetos de lei estariam causando desgastes internos na bancada da legenda na Casa de Leis.
DECORO
Toda ação praticada pelos parlamentares que não está de acordo com a conduta esperada é chamada de quebra de decoro parlamentar. Carlão, o presidente da Câmara Municipal, não se manifestou sobre o episódio de ontem.