A tomada do poder no Afeganistão pelo Talibã poderia dar oportunidades a grupos terroristas para florescer e ameaçar alvos dentro e fora do país, disseram analistas à Sputnik.
Em 15 de agosto, o Afeganistão caiu nas mãos do Talibã (organização terrorista proibida na Rússia e em vários outros países), forçando os Estados Unidos e outras missões estrangeiras presentes no país a evacuar seus cidadãos. Ataques terroristas subsequentes, organizados pelo Estado Islâmico-Khorasan (organização terrorista proibida na Rússia e em vários outros países) atingiram o aeroporto de Cabul, matando 13 militares norte-americanos.
As tropas da OTAN se retiraram do país, deixando uma centena de americanos e milhares de afegãos que tinham solicitado os vistos necessários a fim de viajar para os Estados Unidos.
Enquanto isso, o Talibã já poderia ter uma guerra civil em suas mãos, tendo em conta que combatentes da Aliança do Norte permanecem no vale de Panjshir, no nordeste do país, preparados para lutar.
Guerra civil?
A província nordestina de Panjshir é o reduto da Frente de Resistência Nacional, liderada por Ahmad Massoud, filho do lendário comandante da guerrilha Ahmad Shah Massoud, e pelo antigo vice-presidente da administração Ghani, Amrullah Saleh, que se declarou presidente interino. No entanto, recentemente, o porta-voz do Talibã, Mohammad Naim, disse à Sputnik que o movimento não vai tomar Panjshir pela força. Entretanto, hoje (2) chegaram notícias em contrário.
© REUTERS / AGÊNCIA AAMAJCombatentes se preparam para se defender das forças talibãs na província de Panjshir, Afeganistão, 22 de agosto de 2021
Embora o movimento considere o Daesk-K uma ameaça, ainda há questões sobre seus laços com a Al-Qaeda (organização terrorista proibida na Rússia e em vários outros países). A perspectiva de que esses grupos se juntem é algo que os analistas pensam que deve ser levado em consideração.
“Será que a Al-Qaeda e seu ‘primo’, o Estado Islâmico, lançará sua raiva contra os EUA e seus aliados ou eles vão virá-lo para dentro, sujeitando o Afeganistão a uma guerra civil? É difícil de adivinhar”, afirmou o histórico e analista político Dan Lazare. “Em qualquer caso, a humilhante retirada dos Estados Unidos através do aeroporto de Cabul marcou uma vitória não apenas para as forças nacionalistas afegãs, mas também para os jihadistas e extremistas em todo o mundo.”
Após 20 anos da guerra contra o terror, acrescenta Lazare, “os terroristas venceram”.
“Eu diria que, sim, a ameaça terrorista está aumentando”, disse. “Basicamente, os jihadistas obtiveram sua maior vitória desde a queda de Constantinopla em 1453. Então, se isso não incentivar a Al-Qaeda, não sei o que incentivará”.
Porém, o mundo é também ameaçado por outra grande entidade terrorista, explica Lazare.
“No que diz respeito a outra fonte de terror, os Estados Unidos, ela está também está em ascensão”, disse. “[O presidente Joe] Biden deixou claro que continuará bombardeando o Afeganistão enquanto desejar. Isso significa mais horrores como o SUV cheio de crianças que ficou em chamas no domingo [29], mais festas de casamento bombardeadas, e assim por diante.”
Pior ainda, adicionou, agora que os EUA passaram para a defensiva, eles muito provavelmente vão atacar de forma cada vez mais cega a Rússia, a China e o Irã.
“Isso poderia significar uma guerra de escala ainda maior do que vimos até agora, o que é aterrorizante. O quociente de irracionalidade está subindo, e é por isso que eu acho que a perspectiva é de uma maior turbulência”, avisou o especialista.
Guerra do Afeganistão: experiência fracassada
O vice-presidente do Centro Eurásia, Earl Rasmussen, acha que toda a guerra americana de duas décadas no Afeganistão foi um estudo fracassado com metas confusas, conflitantes e mutáveis.
“Os Estados Unidos e seus aliados gastaram US$ 2 trilhões (R$) e milhares de vidas durante a missão. Inicialmente, nos disseram que isso era para perseguir Osama bin Laden e a Al-Qaeda, mas, uma vez que a Al-Qaeda foi derrotada, ou melhor, domada, permanecemos e começamos um conflito contra o Talibã”, disse ele.
© AP PHOTO / KHWAJA TAWFIQ SEDIQIHomem vendendo bandeiras do grupo insurgente Talibã em Cabul, no Afeganistão, em 30 de agosto de 2021
Quase metade da população afegã de cerca de 40 milhões passou a viver sob um governo democrático, embora corrupto, mas ao mesmo tempo estava rodeada por conflitos e guerras sem fim, notou Rasmussen.
“É de perguntar por que tanto esforço e tanto tempo para lidar com um conflito em um país encravado no outro lado do mundo”, questiona.
Se a estabilidade puder ser alcançada e as guerras terminarem para sempre, o Afeganistão ainda teria as sementes para o crescimento e a prosperidade futuros, sugeriu o vice-diretor.
“A questão é: será que a nova liderança e as pessoas vão ver este futuro? Será que os governos globais vão trabalhar junto com o Afeganistão para promover um futuro pacífico e próspero?”, perguntou.
Resta saber como o Talibã vai governar e como eles vão se adaptar às mudanças populacionais e às suas expectativas de governo, concluiu Rasmussen.