Documentos enviados ao STF pela defesa do ex-presidente Lula e dados acessados pela mídia mostram como a força-tarefa da Operação Lava Jato tentou adquirir o software de espionagem israelense na tentativa de criar “bunker” cibernético.
Nesta segunda-feira (26), em uma petição protocolada no STF (Supremo Tribunal Federal), a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, revela como os procuradores em Curitiba teriam buscado criar um sistema de espionagem cibernética clandestina.
A perícia tem como base mensagens de chats entre membros da Lava Jato apreendidas na Operação Spoofing, segundo o UOL.
De acordo com a petição encaminhada, a partir de diálogos de procuradores, “a Operação Lava Jato teve contato com diversas armas de espionagem cibernética, incluindo o aludido dispositivo Pegasus“.
Em uma conversa no chat de um grupo de procuradores em 31 de janeiro de 2018, é citada uma reunião entre os membros da Lava Jato do Rio de Janeiro, de Curitiba e representantes de uma empresa israelense que vendiam uma “solução tecnológica” que “invade celulares em tempo real”. Essa tecnologia, segundo os advogados, mais tarde seria identificada como sendo o Pegasus.
O documento é assinado pelos advogados Valeska Teixeira Martins e Cristiano Martins.
Na petição, a defesa de Lula ainda aponta como os membros da Lava Jato revelaram, em 2017, “a intenção de criar um ‘bunker’ no gabinete do procurador da República Deltan Dallagnol”.
“Esse ‘bunker’ envolvia justamente a aquisição de softwares de espionagem cirbernética, como é o caso do israelense Cellebrite, e outros sistemas que permitiriam viabilizar a criação de um ‘big data’ no gabinete do citado membro do Ministério Público Federal [MPF]”, apontam os advogados citados pela mídia.
Entretanto, o que os advogados do ex-presidente identificaram nas conversas de chat seria apenas parte da história, pois e-mails obtidos pela mídia mostram que, de fato, entre março de 2018 e o início de 2019, o procurador Júlio Noronha, que integrou a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba por cinco anos, manteve contato com representantes no Brasil da empresa NSO Group, dona do software Pegasus, para tentar adquirir a ferramenta.
Em uma conversa trocada no fim de março de 2018, a NSO Group informa a Noronha, em um e-mail intitulado “PEGASUS”, que algumas “funcionalidades” do sistema seriam incluídas na “versão 3.0” da ferramenta, após observações feitas por integrantes do Ministério Público (MP) em conversas anteriores. Alguns desses e-mails foram encaminhados ao procurador Roberson Pozzobon.
© AP PHOTO / DANIELLA CHESLOWLogotipo da empresa israelense NSO Group no prédio em que tinha escritórios, em Herzliya, Israel (foto de arquivo)
Segundo a mídia, 15 dias depois, os representantes da NSO no Brasil foram convidados pelo analista do MPU (Ministério Público da União), Marcelo Beltrão, a irem a Brasília para “uma apresentação e demonstração do Pegasus na Procuradoria-Geral da República [PGR]”.
As conversas teriam acontecido até o começo de março, mas com a posse de Augusto Aras, em setembro de 2019, as tratativas foram suspensas.
A mídia também diz que em maio deste ano, um revendedor brasileiro tentou oferecer o sistema Pegasus ao Ministério da Justiça, que abriu uma licitação para a aquisição da nova “solução de inteligência em fontes abertas, mídias sociais, deep e dark web“.
Porém, na licitação para aquisição da ferramenta, o software foi criticado por integrantes da cúpula militar na época. Um dos generais críticos do sistema era o então ministro da Secretaria de Governo, Carlos dos Santos Cruz, segundo o UOL.
O cancelamento do contrato com a NSO Group ocorreu após ser evidenciado envolvimento do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, na negociação.
A mídia diz que tentou entrar em contato com o procurador Júlio Noronha, mas não obteve resposta. Já o procurador Roberson Pozzobon disse, por meio de nota da assessoria do MPF, que “várias empresas procuraram a Lava Jato, por meio dos procuradores, para oferecer soluções tecnológicas”, acrescentando que o sistema Pegasus “não foi adquirido pelo órgão”.