Governo Lula caminha para um abismo fiscal

Contas públicas têm déficit de R$ 35 bi em julho, no 2º pior resultado da para o mês na História

As contas do governo federal fecharam o mês de julho com um déficit R$ 35,9 bilhões, informou nesta quarta-feira o Tesouro Nacional. O resultado é segundo pior para o mês de toda a série histórica do governo, iniciada em 1997.

O dado do mês passado só é melhor que o resultado de julho de 2020, quando o rombo somou R$ 109,6 bilhões por conta de gastos relacionados à pandemia da Covid 19.

Caminhando para o abismo fiscal

Segundo a consultora econômica Zeina Latif afirmou ser difícil acreditar que o governo irá conseguir cumprir a meta fiscal do ano que vem, de zerar o déficit primário.

“A gente está falando de muitas incertezas ao que pode trazer de receitas […] São R$ 168 bilhões que vão depender de decisão do Congresso”, afirmou.

Latif também citou as dificuldades que o governo enfrentou para aprovar a retomada do voto de qualidade no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf).

“A MP [medida provisória] teve que voltar, depois venceu, teve que tentar por outro caminho, e com ajustes que reduzem a estimativa de receita. Por todas essas questões, fica difícil a gente acreditar que vai zerar o déficit”, completou.

No entanto, a economista destacou que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não tinha como seguir outro caminho em relação ao Orçamento.

“Nesse momento, não havia como Haddad fazer diferente […] Se ele viesse com um número que viesse a ser crível, vamos dizer assim, seria jogar a tolha muito cedo em termos de reputação. Esse seria um cenário ainda pior”, avaliou.

Pacote de arrecadação de Haddad deve enfrentar dificuldades no Congresso, e analistas veem déficit zero em 2024 com ceticismo

Segundo o estudo, realizado entre os dias 22 e 25 de agosto, 54% dos especialistas consultados veem chances “baixas” ou “muito baixas” de o objetivo apontado no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) ser cumprido pelo Poder Executivo.

Outros 45% atribuem chance “moderada” de o governo atingir o objetivo, enquanto nenhum analista político entrevistado vê como o cenário mais provável, sobretudo em um período que contemplará eleições municipais.

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Considerando uma escala de 1 (muito baixa) a 5 (muito alta), a probabilidade média atribuída pelos especialistas para o cumprimento da meta no ano que vem ficou em 2,36.

Trata-se de um sinal concreto do ceticismo generalizado, a despeito das reiteradas manifestações dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet (MDB), de que o objetivo será mantido pelo governo e será perseguido no primeiro ano de vigência do novo arcabouço fiscal.

“O governo vai depender de propostas one-off para cumprir a meta”, observou um analista político. Conforme acordado previamente com os participantes, os resultados são divulgados apenas de forma agregada, sendo preservado o anonimato das respostas e dos comentários.

“O governo dificilmente conseguirá cumprir com a meta de zerar o déficit primário em 2024 se não começar a promover medidas de cortes de gastos. O foco tem sido dado apenas no aumento de receitas, que não tem se mostrado suficiente, e depende do crescimento econômico em um mundo em ritmo de desaceleração”, pontuou outro especialista consultado.

O novo arcabouço fiscal, que substitui o teto de gastos e acabou de ter tramitação concluída no Congresso Nacional, estabelece metas de resultado primário para o governo federal, com bandas de tolerância de 0,25 ponto percentual para cima ou para baixo em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). Ou seja, para 2024, o objetivo fixado é alcançar o equilíbrio das contas públicas, mas caso o resultado efetivo seja de um déficit de até 0,25% do PIB, não haverá necessidade de acionar gatilhos fiscais.

Pelo texto aprovado pelos parlamentares, os gestores públicos ficam afastados de sanções administrativas e jurídicas em caso de descumprimento das metas, desde que tenham adotado medidas de limitação de empenho e pagamento, preservado o nível mínimo de despesas discricionárias necessárias ao funcionamento regular da administração pública e não tenham ordenado ou autorizado medida em desacordo com as vedações previstas na própria lei complementar.

A versão que saiu do Congresso Nacional determina que vedações de despesas previstas na Constituição Federal sejam aplicadas em caso de descumprimento da meta fiscal estabelecida. Se for a primeira vez, o governo estará impedido, no exercício seguinte, de criar cargo, emprego ou função que implique em aumento de despesa, além de promover qualquer alteração de estrutura de carreira que provoque impactos sobre as contas públicas.

O governo também fica impedido de criar qualquer despesa obrigatória ou reajustar qualquer gasto desta natureza em percentual acima da inflação, expandir linhas de financiamento, conceder ou ampliar incentivo ou benefício de natureza tributária e criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório em favor de membros de Poder e servidores.

Caso seja o segundo ano de descumprimento da meta fiscal, somam-se às restrições impostas pela regra a proibição de realização de concurso público, exceto para as reposições de vacâncias, e a vedação para a concessão, a qualquer título, de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração de membros de Poder ou de órgão, de servidores e empregados públicos e de militares, exceto dos derivados de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à regra.

Do lado fiscal, toda vez que o resultado primário ficar abaixo da faixa mínima da banda de tolerância da meta estabelecida, o governo só poderá ampliar os gastos de um exercício para o outro à razão de 50% do crescimento de despesas no ano anterior, descontada a inflação e respeitando o mínimo de 0,6% e o máximo de 2,5% reais.

Caso não altere a meta de zerar o déficit primário em 2024 ao longo da tramitação do PLDO no Congresso Nacional, como têm defendido integrantes do próprio Palácio do Planalto, o governo dependerá de medidas adicionais de incremento de receitas, que serão encaminhadas nesta quinta-feira (31) ao parlamento juntamente com a lei orçamentária.

Novo pacote de receitas

Barômetro do Poder capturou um ceticismo dos analistas políticos quanto à capacidade de o governo Lula conseguir aprovar no Congresso Nacional as mudanças nas regras de tributação dos fundos exclusivos e das “offshores” ainda em 2023. Como boa parte das medidas apontadas envolve a cobrança de Imposto de Renda, é preciso cumprir o princípio da anterioridade ‒ ou seja, para valerem no ano que vem, as medidas precisam ser aprovadas por deputados e senadores até 31 de dezembro.

No caso dos fundos exclusivos, 30% dos analistas políticos consultados atribuem chances “baixas” ou “muito baixas” de avanço ‒ mesmo percentual dos que veem probabilidade elevada. Outros 40% observam chance “moderada”. Considerando uma escala de 1 a 5, a probabilidade média atribuída pelos analistas consultados para o avanço da matéria ainda neste ano é de 2,90.

Já do lado das “offshores”, 20% veem chances “baixas” ou “muito baixas”, contra 80% que avaliam probabilidade “moderada”. Nenhum especialista acredita que será fácil aprovar o texto, que já chegou a ser enviado anteriormente pelo governo na forma de medida provisória (MPV 1171/2023), mas caducou.

O levantamento também testou as impressões dos especialistas sobre as chances de avanço do fim dos Juros sobre o Capital Próprio (JCP) e a cobrança de imposto sobre a distribuição de lucros e dividendos. No primeiro, apenas 10% veem chances elevadas, enquanto no segundo o grupo soma 20%. Em ambos os céticos são maioria folgada: 40% e 50%, respectivamente.

Quando o prazo para aprovação da tributação sobre lucros e dividendos é ampliado para além de 2023, as percepções negativas caem para 9%, ao passo que a avaliação de chance elevada de aprovação salta para 36%.

Para os especialistas consultados, outras medidas com impactos positivos na arrecadação federal teriam mais facilidade de avançar no parlamento. A primeira delas é a tributação de apostas esportivas, vista com boas chances de aprovação neste ano por todos os entrevistados.

Também aparecem na lista a possibilidade de reabertura de um programa de repatriação de recursos mantidos no exterior e um novo Refis. Nos dois casos, metade dos analistas políticos indicou “boas” chances de avanço no Congresso.

Esta edição do Barômetro do Poder ouviu 8 consultorias políticas – BMJ Consultores Associados; Control Risks; Empower Consultoria; Eurasia Group; Patri Políticas Públicas; Prospectiva Consultoria; Pulso Público; e Tendências Consultoria Integrada – e 3 analistas independentes – Antonio Lavareda (Ipespe); Carlos Melo (Insper); e Thomas Traumann.

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