Nos últimos 14 meses, o noticiário econômico tem se acostumado com aumentos gradativos da taxa básica de juros, a Selic.
A cada 45 dias, o Comitê Nacional de Política Monetária (Copom) se reúne e decide os rumos da economia nacional. Pela 10ª vez seguida, a reunião terminou com alta no indicador em 1 ponto porcentual, chegando a 12,75% ao ano.
O último mês de estabilidade foi janeiro de 2021, na ocasião o Copom manteve a taxa em 2%, assim como nas três reuniões anteriores. No encontro seguinte, em março daquele ano, a taxa saltou para 2,75% e não parou mais o movimento de alta.
Para o doutor em Economia e professor da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) Mateus Abrita, esse acaba sendo um dos poucos mecanismos que o Banco Central (BC) tem para controlar a inflação, porém, deve ser pouco efetivo.
“A gente vive um surto inflacionário global, e esse instrumento não atua necessariamente na causa. A taxa de juros é mais usada para conter inflação de demanda, e temos uma inflação de custos”.
Ainda segundo ele, as cadeias globais de commodities estão em desequilíbrio e, com as recentes restrições nos portos de Xangai, Hong Kong e região, os preços de custos devem continuar pressionados.
“Gera desequilíbrio da cadeia produtiva que leva a aumentos em petróleo, gás e grãos. Com os custos subindo, o BC não tem outras medidas para conter a alta, mas nosso regime de meta de inflação é formado assim”.
Lilian Linhares, sócia e head de alocação da Rio Negro Investimentos, diz que o mercado espera ainda mais uma alta para a reunião de 21 de junho.
“Com o cenário deste ano e a inflação vindo acima do esperado, o Copom tem se adiantado, e as projeções subiram para 13,25%. Dependendo das próximas prévias da inflação, o mercado acha que pode chegar a 13,75%”.
“Após o resultado das eleições, nós esperamos que o Copom volte a revisar a taxa de juros, ao menos é o que ele tem indicado nas declarações”, comenta Lilian.
INFLAÇÃO
Na última semana, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-15), parcial da inflação oficial, indicou o maior aumento em 24 anos: 1,73%, quase 12% no acumulado de 12 meses.
A partir da prévia, economistas já trabalham com a inflação a 8,3% ao fim do ano, acima dos 6,5% esperados em janeiro e acima dos 5,5% projetados pelo governo federal.
Com alta de 7,51%, a gasolina foi a principal responsável pelo aumento da inflação na prévia de abril. Houve altas acentuadas também do diesel, do etanol e do gás veicular, levando o aumento dos transportes a 3,43%.
Ainda segundo analistas, os números da inflação mostram que encher o carrinho do mercado também está mais difícil. Os preços dos alimentos e bebidas aumentaram 2,25% na prévia de abril, puxados por produtos consumidos dentro de casa.
Quanto mais a inflação sobe, menor é o poder de compra do consumidor. E com a Selic acontece o mesmo, pois o consumidor perde o acesso ao crédito.
O doutor em Economia Michel Constantino explica que existem algumas variáveis a serem analisadas pelo Copom na hora de determinar a taxa de juros. E que não é possível determinar se haverá impacto na redução da inflação.
“Teremos pelo menos um desestímulo ao aumento de crédito, e isso diminui a pressão inflacionária”, pondera.
Mestre em Economia, Eugênio Pavão destaca que o cenário é desafiador. “Para enfrentar a inflação, o governo optou pela política monetária para reduzir a atividade econômica e, assim, provocar a queda da inflação. Entretanto, a inflação se mostrou persistente por fatores externos, não respondendo às altas da taxa juros ao nível atual”.
Abrita alerta que, com os rumos que a economia brasileira tem tomado, o que preocupa é principalmente a geração de empregos.
“Essa alta da taxa de juros prejudica a economia como um todo, porque com alta da taxa de juros a gente tem uma queda de investimentos na economia real, e isso prejudica o emprego”, avalia.
FUGA DE CAPITAIS
Com a alta dos juros, o governo tenta manter o País como um bom destino de investimentos para o dinheiro estrangeiro.
Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), a inflação mundial deve ficar em 5,6% para países desenvolvidos neste ano e na faixa de 8,6% para os países emergentes.
Essa forte alta para economias estabilizadas deixa a situação dos países em desenvolvimento complicada.
Economistas consultados dizem que, à medida que países mais estabilizados remuneram melhor investidores estrangeiros por meio de juros de títulos públicos, é natural que os dólares que enchiam os emergentes fujam para a segurança.
Alguns economistas afirmam que a alta da Selic desestimula a aplicação de dinheiro no crescimento da economia. No entanto, para investimentos em ativos financeiros, ela pode gerar oportunidades
Lilian vê o mercado bom para quem se interessa em renda fixa e tem a intenção de fazer a migração para esse produto.
“Temos notado alta de procura em títulos indexados à inflação e recomendado a compra deles porque protegem bem neste cenário de incerteza”;
A especialista ainda diz que não é hora de travar as taxas em fundos prefixados. E aconselha os títulos de curto prazo, com vencimentos de, no máximo, quatro anos.
14% até o fim do ano
O mercado já projeta que a Selic pode chegar a 14% no fechamento do ano.